Hoje, o Ver-o-Peso faz aniversário de 384 anos, ainda com o título de principal cartão postal de Belém. São quase quatro séculos presente no imaginário do paraense. Mais do que a face de Belém, o complexo do Ver-o-Peso é uma mistura dos mais variados personagens do cotidiano da cidade, por meio das mais distintas relações de trabalho e sabedoria.
Corte de cabelo, limpeza de pele, brinquedos e um palco para apresentações folclóricas, são algumas das atividades que o público terá durante a manhã deste domingo (27), na feira do Ver-o-Peso.
Várias atividades foram preparadas para comemorar os 384 anos da maior feira livre a céu aberto da América Latina.
Orientações sobre Doenças Sexualmente Transmissíveis (DST), dengue e infecções também serão abordadas pelos mais de 50 voluntários que estarão no evento.
O tradicional bolo com 10 metros de comprimento, já é esperado pelo público que começa a chegar na feira. De acordo com a programação, o corte do bolo deverá ser às 11h.
Autoridades do município devem comparecer no local.É o pescador que chega antes do amanhecer para abastecer as feiras e supermercados da capital, o vendedor que compra o pescado para revender ali mesmo, na pedra do Ver-o- Peso ou no Mercado de Ferro; o dono da banca que fornece o peixe frito na feira, junto com o açaí que vem das ilhas e é distribuído para toda a Região Metropolitana.
Em meio a todo esse movimento, estão as vendedoras de ervas, que fornecem sabedoria popular, junto com banhos e perfumes para atrair sorte, casamentos, prosperidade e saúde.
É esta a economia que circula pelo Ver-o-Peso e que despertou a atenção da antropóloga Wilma Leitão, da Universidade Federal do Pará (UFPA), ‘O Ver-o-Peso é o mundo do trabalho, não somente porque funciona 24 horas por dia, durante o ano inteiro, como também por apresentar diferentes relações de trabalho’, frisou a pesquisadora. Ela reuniu em um livro, intitulado ‘Ver-o- Peso: Estudos antropológicos no mercado de Belém”, a produção intelectual de diversos pesquisadores que voltaram os seus estudos para o principal cartão postal de Belém.
‘O Ver-o-Peso é um campo de estudos que sintetiza a felicidade para sociólogos e antropólogos. Nele podemos estudar os aspectos religiosos, políticos, sociais e culturais’, apontou. Apesar de ser o cartão postal que mais traduz a face de Belém a pesquisadora prefere não afirmar que todo belenense conhece o Ver-o- Peso. “O Ver-o-Peso está completamente no imaginário do belenense, mas isto não significa que todos os que morem em nossa cidade conhecem os componentes do Ver-o-Peso, que são as frutas, as ervas, os cheiros, os sabores; tudo o que define os nossos produtos regionais”.
Neste sentido, o Ver-o-Peso serve de objeto de estudo por concentrar num único universo regional produtos, costumes, formas de falar, de se cumprimentar, de negociar e se relacionar. “Tudo o que o pesquisador quiser tem ali”, brincou Wilma.
Para ela, o que difere o Ver-o- Peso das demais feiras livres que existem na América Latina não é a sua dimensão, e sim o hábito e os costumes que neleexistem. “Uma característica bem comum é a prática de se falar que os produtos vendidos no Ver-o-Peso são os de melhor qualidade”, observou.
Esta pratica fortalece a confiança entre consumidor e feirante. “O consumidor que frequenta o Ver-o-Peso é habitual. Ele vai sempre lá. Praticamente só compra no Ver-o-Peso”. No aspecto da geração de renda - uma das particularidades levantada pela antropóloga - o Ver-o-Peso apresenta uma característica bem peculiar, que é a relação entre renda e escolaridade dos feirantes. “Muitas pessoas acreditam que aqueles trabalhadores estão ali porque não tem estudo. De fato, podem até não ter, mas no final do mês, se a gente for perceber, a renda deles é tão igual, muitas vezes superior, a de quem tegraduação. Querendo ou não,isto é uma particularidade”, analisou.
Por atender as necessidades de vendedores, consumidores e comerciantes, o Veropa, como também é chamada a feira livre, consegue se autorregular diariamente. “Um exemplo disto são as erveiras, que às vezes compram de mateiros e depois vendem para o consumidor direto e até para comerciantes”, observou.
Quanto ao artesanato vendido na feira do Ver-o-Peso, poucos são para consumidores. “Os produtos artesanais são vendidos para outros artesãos, que revendem o que encontram ao recorrer ao Ver-o-Peso para ter matéria-prima”, comentou Leitão.
Neste cenário de autorregulação, relações socioeconômicas de hábitos e culturas, Wilma Leitão chama atenção entre os personagens que circulam diariamente pela feira do Ver-o-Peso. Um deles é o carregador, figura que, para a antropóloga, é conhecedora de técnicas e que transita por entre os mais diversos atores sociais.
“O carregador tem um papel fundamental para o abastecimento das barracas, além disso, serve aos consumidores. São trabalhadores que exercem um cargo de confiança tanto do peixeiro quanto do consumidor”, ressaltou.
Outro personagem é o feirantes, cuja paixão pelo local de trabalho se destaca.
“É comum a gente encontrar feirantes que dizem que o Ver-o-Peso é a vida deles. Com o que ganham lá, sustentam os filhos. Aprenderam com os pais a trabalhar na feira e hoje ensinam os filhos”, comprovou Wilma.
Outro personagem é a pessoa que vai regularmente à feira, e que ajuda aquele espaço a se renovar dia e noite.
Uma aparente calmaria invade o Ver-o-Peso à noite. O mercado de peixe e as barracas da feira fecham. O movimento fica por conta das vendas de bebidas e comida na beira da Baía do Guajará, onde até turistas se arriscam em perigosas incursões noturnas. A maioria dos feirantes volta para o descanso das suas casas. A jornada pesada de trabalho começou às 3h da manhã e se estendeu até à noite.
Muitos dormem por ali mesmo, nas próprias barracas. Fazem do mercado um lar. Carregadores se ajeitam nos próprios carros de mão que usam para trabalhar. Marítimos jogam conversa fora e tomam cachaça. Passam o tempo enquanto aguardam a hora de desembarcar o peixe.
São duas da manhã e as mercadorias chegam em grande número para os feirantes e revendedores do Ver-o-Peso. Em frente ao Solar da Beira, vários carros descarregam sacos de frutas, legumes e verduras, carregados incessantemente por homens. Um surge com um tabuleiro onde estão à venda canetas, fósforos, tesouras, alicates e lanternas. “Tenho tudo que é de primeira utilidade, a caneta pro comerciante anotar, a lanterna pra focar o peixe”, diz Rômulo Souza, que há 15 anos sustenta as filhas como ambulante.
Na esquina da Boulevard Castilhos França com a avenida Portugal, dezenas de barcos se amontoam. “Isso aqui é um ‘rebuceteio’ de gente. Bandido e pai de família lutando. Tem uma magia”, filosofa seu Sena, em meio a anúncios de carne acebolada e correio sentimental disparados da sua ‘moto-som’. Na Pedra do Peixe, o ritmo é frenético: um caixote carregado de maparás pode nocautear os mais desatentos.
Doses de R$ 0,50 a R$ 10 de cachaça e conhaque são oferecidas para dar aquela aquecida. O vento é frio e o cheiro de pescado fresco se mistura aos temperos. Também atiça o olfato o café compartilhado por vários. Seu Zezé, “no mar” há 30 anos, diz que ali chega e ali finda. “Aprendi a vida aqui nessa beirada”, entrega. E é na beirada que não dá pra enxergar a água da baía: é grande quantidade de lixo e pele de peixe jogada pelos peixeiros.
Cachorros lambem as verduras. Os comerciantes que aproveitam para ‘fazer a feira’ não parecem se importar. Na Praça do Relógio, encarregados dos caminhões que transportam para outros mercados se unem aos feirantes para jogar cartas. Na Feira do Açaí, o tecnobrega soa. Rasas (espécie de cestas) são jogadas para os que trazem açaí nos barcos.
“Se tiver com massa tá bom, se tiver só casca não presta. Esse açaí é de Macapá, na verdade, da parte da Ilha do Marajó que fica mais longe e é melhor que o pouco açaí de inverno daqui”, ensinou o freguês Estevão Nascimento. Adiante, homens dormem em pedaços de papelão espalhados pelo chão. O manto da noite vai dando vez aos primeiros reflexos da manhã.
É hora de comer a “pata da vaca”, sopa revigorante oferecida com entusiasmo pelo comerciante Paulo Santiago. Os sinos da Catedral da Sé anunciam as seis da manhã e os ônibus já circulam intensamente pelas ruas. Agora são as barracas de comida que saciam a fome dos que passam e vivem naquele lugar onde pulsa o coração de Belém. (Diário do Pará)
Outro personagem é a pessoa que vai regularmente à feira, e que ajuda aquele espaço a se renovar dia e noite.
Uma aparente calmaria invade o Ver-o-Peso à noite. O mercado de peixe e as barracas da feira fecham. O movimento fica por conta das vendas de bebidas e comida na beira da Baía do Guajará, onde até turistas se arriscam em perigosas incursões noturnas. A maioria dos feirantes volta para o descanso das suas casas. A jornada pesada de trabalho começou às 3h da manhã e se estendeu até à noite.
Muitos dormem por ali mesmo, nas próprias barracas. Fazem do mercado um lar. Carregadores se ajeitam nos próprios carros de mão que usam para trabalhar. Marítimos jogam conversa fora e tomam cachaça. Passam o tempo enquanto aguardam a hora de desembarcar o peixe.
São duas da manhã e as mercadorias chegam em grande número para os feirantes e revendedores do Ver-o-Peso. Em frente ao Solar da Beira, vários carros descarregam sacos de frutas, legumes e verduras, carregados incessantemente por homens. Um surge com um tabuleiro onde estão à venda canetas, fósforos, tesouras, alicates e lanternas. “Tenho tudo que é de primeira utilidade, a caneta pro comerciante anotar, a lanterna pra focar o peixe”, diz Rômulo Souza, que há 15 anos sustenta as filhas como ambulante.
Na esquina da Boulevard Castilhos França com a avenida Portugal, dezenas de barcos se amontoam. “Isso aqui é um ‘rebuceteio’ de gente. Bandido e pai de família lutando. Tem uma magia”, filosofa seu Sena, em meio a anúncios de carne acebolada e correio sentimental disparados da sua ‘moto-som’. Na Pedra do Peixe, o ritmo é frenético: um caixote carregado de maparás pode nocautear os mais desatentos.
Doses de R$ 0,50 a R$ 10 de cachaça e conhaque são oferecidas para dar aquela aquecida. O vento é frio e o cheiro de pescado fresco se mistura aos temperos. Também atiça o olfato o café compartilhado por vários. Seu Zezé, “no mar” há 30 anos, diz que ali chega e ali finda. “Aprendi a vida aqui nessa beirada”, entrega. E é na beirada que não dá pra enxergar a água da baía: é grande quantidade de lixo e pele de peixe jogada pelos peixeiros.
Cachorros lambem as verduras. Os comerciantes que aproveitam para ‘fazer a feira’ não parecem se importar. Na Praça do Relógio, encarregados dos caminhões que transportam para outros mercados se unem aos feirantes para jogar cartas. Na Feira do Açaí, o tecnobrega soa. Rasas (espécie de cestas) são jogadas para os que trazem açaí nos barcos.
“Se tiver com massa tá bom, se tiver só casca não presta. Esse açaí é de Macapá, na verdade, da parte da Ilha do Marajó que fica mais longe e é melhor que o pouco açaí de inverno daqui”, ensinou o freguês Estevão Nascimento. Adiante, homens dormem em pedaços de papelão espalhados pelo chão. O manto da noite vai dando vez aos primeiros reflexos da manhã.
É hora de comer a “pata da vaca”, sopa revigorante oferecida com entusiasmo pelo comerciante Paulo Santiago. Os sinos da Catedral da Sé anunciam as seis da manhã e os ônibus já circulam intensamente pelas ruas. Agora são as barracas de comida que saciam a fome dos que passam e vivem naquele lugar onde pulsa o coração de Belém. (Diário do Pará)
Fonte: O Liberal
Orgulho de Ser Paraense